A década era 1980. A era de ouro do rock nacional. Em plena Brasília, durante o regime militar, jovens embarcavam na onda dos anos 70, empunhavam suas guitarras e entoavam suas vozes contra a política do país. Foi a explosão do BRock e também de um sentimento de revolução.
Na primeira edição do Rock in Rio, em 1985, Herbert Vianna, líder d’Os Paralamas do Sucesso, mandou o recado: “Ontem foi escolhido o novo presidente do Brasil e a gente vai ver aquela careca na TV por um bom tempo, mas a gente espera que alguma coisa boa seja feita já que nós não sabemos escolher presidente, já que escolheram pela gente”, disse antes de tocar “Inútil”, do Ultraje A Rigor, para 250 mil pessoas. O vocalista se referia às eleições indiretas que elegeram Tancredo Neves, primeiro presidente pós-regime militar.
Anos mais tarde, durante o Programa Livre, em 1994, Renato Russo criticou o regime militar citando a censura explicando a letra de “1965 Duas Tribos”. “Está uma coisa muito perigosa de, tipo assim, ‘a gente era feliz naquela época’. Gente eu não me lembro de ser feliz naquela época, não. Fazer redação dizendo que o presidente é maravilhoso quando de repente, muito tempo depois, a gente descobre que pessoas estavam sendo mortas em nome de uma grande coisa que não se sabe o que é. E eu acho isso muito muito péssimo”, disse o líder da Legião Urbana.
Mais recente, em 2011, Dinho Ouro Preto, relembrou esse período durante a edição de retorno do Rock in Rio ao Brasil. “Tinham três coisas que a gente fazia quando era garoto que a gente se amarrava. Era andar de skate, ouvir rock’n’roll e falar mal do governo. Na verdade, os anos foram passando e a gente descobriu que a gente gostava de falar mal de qualquer governo, fosse ele qual fosse. De esquerda ou de direita. Todos são iguais. A regra básica é: nunca confie num político. Essa aqui é para as oligarquias que parecem ainda governar o Brasil e deixar os grandes jornais censurados, como O Estado de São Paulo. Essa aqui é para o Congresso Brasileiro. Essa aqui é em especial para o José Sarney”. Na ocasião, o líder do Capital Inicial, dedicou a canção “Que País É Este?” aos políticos brasileiros.
Além dos discursos acalorados durante suas apresentações, não faltam críticas também em suas letras. Legião Urbana, Paralamas do Sucesso, Plebe Rude e Capital Inicial, o quarteto fantástico do BRock, foram autores e protagonistas de músicas que cantavam os problemas políticos e sociais do país na década de 80. Além deles, Barão Vermelho, Cazuza, Titãs e muitos outros denunciavam nossa crise política crônica. E como dizia Renato Russo, “o Brasil é o país do futuro”.
No entanto, diante de uma das maiores crises políticas que o Brasil já viveu, nossos ídolos, aos 50 anos, continuam entoando suas canções de protesto com a mesma vibração de seus 20, mas já não têm mais seus discursos acalorados e cheios de vontade de mudar o mundo. A crítica política permanece nas canções que parecem escritas hoje, mas os discursos têm sido mais comedidos.
Em show de comemoração dos 30 anos do lançamento do primeiro disco da Legião Urbana, Dado-Villa Lobos chegou a dedicar “1965 Duas Tribos” aos “nossos nazistas, que estão voltando” e momentos depois o guitarrista comentou a votação do impeachment da presidente afastada Dilma Rousseff, na Câmara dos Deputados. “Semana passada eu assisti àquilo tudo e percebi que este é o grandíssimo ‘Teatro dos Vampiros’”, disse sem críticas diretas. O músico chegou ainda a lembrar a Ditadura Militar, mas também sem grande dureza: “É f…”, limitou-se.
Também o Titãs, autores de uma das letras mais políticas e duras, “Vossa Excelência”, uma crítica clara e direta ao sistema político do Brasil, lançada na épica do escândalo do Mensalão, preferiu a crítica contida. Em seu último show no Rio de Janeiro, no último dia 20 de maio, a canção chegou a ser pedida pelo público, mas a banda disse “tocar uma parecida de mais alguns anos atrás”, anunciando “Desordem”.
Cerca de 30 anos depois continuamos a ser o país do futuro. Continuamos a acreditar que o futuro do nosso país irá mudar. Cremos que toda a crise política que vivemos antecede dias melhores. E resgatamos os mesmos gritos daqueles que hoje são nossos pais.
Por Thaiane Silveira, Foi Show.