Como explicar racionalmente o que se sente? Como descrever em palavras as sensações ao presenciar o encontro de duas das mais lindas vozes que representam a música no Brasil, cantando juntas, no mesmo palco? E mais, não só no mesmo palco, mas sucessos de ambos e de outros artistas de todos os tempos? Com certeza, só estando lá, vivenciando o espetáculo para entender o que diremos aqui. Não é tarefa simples essa pretensão e, sim, já adiantamos, eles estarão em outros estados do país e sugerimos fortemente que não percam. Mesmo! Nunca se sabe se um encontro dessa dimensão será possível novamente.
A primeira impressão que fica, para quem tinha o antigo Ana e Jorge em mente é: ‘Nossa! Como eles cresceram!’ É visível! Menos ingênuos (e talvez alguém possa lamentar essa certa falta de informalidade, mas, certamente essa turnê não é despretenciosa como a anterior. É um projeto, efetivamente!), mais afiados, mais elegantes e sofisticados. Do figurino a iluminação, passando pela escolha do repertório e dos arranjos, tudo está feito para transmitir a grandiosidade desse encontro de gigantes. Não há mais nenhum desconhecido no palco. E a platéia sabe disso! Tanto que praticamente 100% do repertório é cantado por todos na casa de shows.
Como acompanhamos tudo o que vem acontecendo, desde a estréia em São Paulo, percebemos que é um espetáculo que não pode receber uma crítica pontual de quem quer que seja, pois está em claro processo de transformação e construção. É um show orgânico, uma troca de vibrações entre os artistas e seu público, um termômetro que oscila de acordo com essa relação, que é conectada pela música, entre os desejos dos artistas e as expectativas e preferências de quem os acompanha. Então, aqui vai a dica número dois: quanto mais presente se fizer a plateia, maiores e melhores serão os artistas no palco. Tenham isso em mente, somos parte do espetáculo! Não há como desejar cantar, dançar, se emocionar, refletir, se expressar durante o show inteiro e passar duas horas fazendo cara de paisagem por medo de passar vergonha. É um show para desconcertar, para agitar, para animar. Shows são experiências. É isso que compramos: emoção! E, para que ele fique pleno, é preciso que essa emoção transpareça. Então, soltem a franga! Sem medo de ser feliz!
Alguns pontos chamaram a nossa atenção:
Primeiro a reação das pessoas às vozes dessas duas criaturas que são mais voz que qualquer outra coisa. A voz de cada um e o que elas são capazes de fazer com quem as escuta é impressionante. Muitos foram os momentos de aplausos durante as canções. Ondas de arrepios corporais nos assolaram o tempo todo. Em especial, quando eles cantavam juntos as canções mais marcantes da primeira edição do encontro, como “É isso aí” e “Pra Rua Me Levar”. Eles tiveram o cuidado de mudar o arranjo, mas mantiveram as partes de cada um, os vocalises, tudo… Ficou realmente aquela sensação de presenciar o DVD antigo e isso é bem legal, porque nos conectamos com essas coisas e, invariavelmente, temos a expectativa de cantar da mesma forma, de acompanhar os artistas. Isso foi muito bacana!
Outro ponto, como disse no texto anterior, que compõe com perfeição a sofisticação do show (e, em grande medida é responsável por isso), é a iluminação que ficou à cargo de Erich Bertti. Está perfeita. Perfeita! Sem ela esse espetáculo, definitivamente, não seria o mesmo.
Dessa vez, conseguimos prestar mais atenção nos companheiros de palco de Ana e Seu Jorge: Mikael Mutti e Rodrigo Tavares. Ora escondidos nas sombras, ora iluminados e compondo com os cantores, se fizeram definitivamente presentes durante o show todo nos acordes preciosos e arranjos lindíssimos feitos para as canções. Escutou-se de tudo: Violoncellos, pianos, percussões e baterias, violinos, eletrônicos… Se não estivessem visíveis poderíamos jurar que havia uma banda inteira presente por trás da cena, porque nas mãos dos cantores víamos apenas guitarras, violões e baixos (com exceção do momento em que Seu Jorge tocou flauta transversal em um de seus momentos solo). Os arranjos foram fortemente responsáveis pelo tom de elegância e sofisticação desse novo encontro que trouxe às versões mais populares e básicas das canções originais um brilho lapidado. Nos sentimos sempre muito felizes e gratas a todos os artistas que, ao se apresentarem ao vivo, não se resumem aos formatos básicos de bandas e nos proporcionam novas sensações ao incorporar instrumentos e arranjos que amplificam as emoções.
O setlist mutante, especificamente nesses shows do Rio (e rogamos para que seja mantida) incluiu a canção “Um Dia Um Adeus” (do brilhante Guilherme Arantes) na voz solo de Ana Carolina que, visivelmente emocionada, nos presenteou com sua interpretação sublime. Não há como não incorporar mais essa “classificação” à artista: cantora, compositora, instrumentista, artista plástica, produtora, editora de vídeos, diretora e intérprete. Não é difícil se tornar fã de uma criatura que consegue preencher tantos espaços emocionais disponíveis em nós de tantas e diversas formas.
Tal qual Seu Jorge em sua interpretação solo de “Talismã” (sucesso nas vozes de Leandro e Leonardo e presente desde o início em São Paulo) quando sua voz parecia preencher todos os espaços disponíveis entre os átomos de tudo o que havia no local. Uma força incrível, uma potência surpreendente.
Também no Rio, fomos presenteados com a participação, nos números de samba, do músico Nene Brown (um dos compositores da divertida “Sábado e Domingo”) na percussão acompanhando Ana e Jorge alegremente. Uma figura! Muito legal e divertida a presença dele e uma bela homenagem dos anfitriões para que lembremos sempre que, por trás de todo grande cantor há sempre um grande compositor (que nem sempre é citado e, na imensa maioria das vezes, é desconhecido da maioria do público que transforma suas canções em sucesso retumbante).
E, para fechar as observações sobre tudo o que vimos, é preciso enfatizar a química que existe entre Ana Carolina e Seu Jorge. Líquidos imiscíveis, gases luminosos e voláteis, quando juntos provocam espanto e emoção. Como os fogos de artifício. Imaginamos o grau imenso de troca energética entre os dois e como deve ser difícil, para dois artistas que não são uma banda, são indivíduos que se pretendem juntos nesse momento para nos presentear, conciliar tudo isso. Afinal, são quase deuses em corpos de humanos. Mas, que fique claro para eles, o efeito disso tudo em nós está valendo à pena. Somos gratos pelo esforço de unir suas forças. Gratos pelos esforços de conciliarem suas agendas, vidas e expectativas. Porque essa emoção toda, que perpassa e é muito maior que qualquer coisa que possamos citar, realmente não tem preço. De verdade, muito obrigada aos dois por terem aceitado o desafio! Sigam em frente, firmes e fortes e mostrem que são, além de todo o talento, profissionais capazes de superar qualquer coisa. Vocês são demais!
Mais uma vez: por favor, por favor, por favor, sabemos que é difícil, mas simplesmente não conseguimos imaginar nossas vidas sem o registro eterno desse encontro em DVD e sem os áudios cuidadosamente preparados para a eternização para que possamos perpetuar e preencher o resto de nossas vidas com suas vozes nesse momento específico da carreira de vocês! Porque esses registros tornam-se nossos bálsamos quando a vida fica difícil demais. Voltamos neles para reviver as emoções, reabastacer o ânimo. São preciosos demais. Aceitem o desafio! Já está genial. Só falta registrar!
Muito obrigada por tudo!