E dando continuidade a sua incrível “Legacy Of The Beast World Tour”, que já havia cravado bandeira na Europa, EUA , e já passando por Rio de Janeiro (04/10) e São Paulo (06/10), chega a vez de o Iron Maiden acertar uma contas com Porto Alegre.
O acerto de contas vem desde a última passagem em 05 de Março de 2008… sim. 12 anos de uma orfandade imensa dos fãs do Rio Grande Do Sul como um todo. Mas eles vieram e pagaram com juros e correção monetária.
Vale salientar que mesmo o show acontecendo em uma quarta-feira (9) o publico que logo cedo cercava a Arena do Grêmio (que vou reservar uma linhas abaixo a respeito) já se encontrava em clima de show. Mas não um show qualquer. Lá pude presenciar uma irmandade incrível entre os fãs que recepcionavam os que vinham chegando nos bares ao redor da Arena. Risos, abraços afetuosos, famílias inteiras, fãs de todas as idades, alguns que foram ao show em 2008 mas que agora levavam seus filhos para testemunhar “aquela banda que o pai ou mãe sempre gostam de ouvir!” e tudo isto com muito respeito. O clima era perfeito para a noite que se seguiria.
Quanto a Arena do Grêmio, com todo respeito aos vários estádios que já pude visitar, que acessibilidade e estrutura!
Logo de cara enquanto dava umas voltas para colher relatos dos fãs, já fui surpreendido com carrinhos de transporte, destes que vemos em set de filmagens e campos de golf fazendo o transporte de fãs PNE, com locomoção limitada ou idosos. Olha, sério. Isso me fez abrir um imenso sorriso. A festa só é boa se for pra todos que lá estão, a celebração e o que a banda traz de energia rompe qualquer tipo de barreira de preconceito físico, identitário, de raça, de credo ou classe social. Este é o espírito desta bendita contra-cultura chamada Rock ‘n’ Roll, a qual enxergamos nela nosso espaço. Viva o Rock! E viva a Arena do Grêmio pela grata surpresa! E não para por ai, acesso fácil, bem identificado a todos os setores, filas escoando de maneira tranquila, tão tranquila que dava para alguns fãs tirarem fotos da fachada da belíssima arena que ressurgiu no lugar do inesquecível Olímpico.
Já dentro, a coisa ficou ainda mais confortável. A disposição de bares, merchandising oficial, bebidas, estande de venda da recém lançada cerveja do Iron Maiden Trooper versão IPA, também estavam lá. Aqui registro de parabéns a Bode Brown Cervejaria que trabalhou em cima da cerveja com afinco.
Já dentro do estádio. Difícil não se encantar. Belo e a disposição das cadeiras e arquibancadas e a ótima ideia da produtora de fazer torres de som e iluminação ” vazadas” só ajudava a visibilidade dos fãs.
A primeira banda a se apresentar com uma energia digna de quem está ali no palco fazendo historia e com a responsabilidade deste fato, foi a Rage In My Eyes. E quem conhece sabe, ali temos músicos incrivelmente dedicados e que por 16 anos nos brindaram com a formação que se manteve com o nome de Scelerata que, coincidentemente, já foram banda de apoio de shows de Paul Dianno, terceiro vocalista do Iron Maiden e primeiro a gravar disco oficial com a banda. ( Antes que me indaguem sei que existiu Paul Mario Day e Dennis Wilcok.).
O show foi um rolo compressor de heavy metal e fúria por assim dizer.
Apesar de curto, por motivo óbvios, se via a satisfação dos ali presentes em ver “sangue do seu sangue” no palco.
Em seguida tivemos a banda padrão de abertura desta turnê do Iron Maiden. The Raven Age manteve o mesmo ritmo e pique dos shows anteriores, em Porto Alegre pude ver mais fãs, cantando as musicas da banda, enquanto se poupavam para o que em breve estariam ali incrédulos a assistir.
E então… As luzes começam a se apagar. A Arena do Grêmio estoura em assovios e gritos histéricos, Doctor Doctor ganha todos os espaços da Arena fazendo os fãs menos atentos (se é que era possível) saírem dos bares em disparada pois aquela musica era o chamado. Os vídeos de introdução do game promovido pela banda nesta turnê ganham os telões, e em seguida… a explosão não de um gol gremista mas de uma instituição do rock chamada Iron Maiden explode a Arena com Aces High.
A conta que a banda tinha com Porto Alegre depois de tanto tempo começava a ser paga com um clássico e pesadíssima!
Notável no rosto de cada um dos membros da banda a sensação de olhar e ver aquele espaço todo tomado pelo publico.
Braços, punhos ao ar, o Refrão de Aces High mostrava que Porto Alegre viveria um dos shows mais incríveis que a cidade ja teve a oportunidade de experienciar.
O setlist não fugiu do que vem sendo executado na turnê. Mas o que muda são os olhares da banda para o publico e vice versa. A troca de energia e diferente em cada local. O clima é notório ser de realização. ‘Where Eagles Dare’ vem com os primeiros “scream for me, Porto Alegre”, de Bruce Dickinson respondido de maneira tão alta que… a cara de surpresa de Bruce pagou a noite.
‘2 minutes to midnight’ em seguida convidou o publico a voltar a 1984 e sair do chão em um dos refrões mais energéticos que a banda possui!!!
Volto a destacar que a banda estava satisfeita demais em estar ali naquele momento trabalhando, porém deixando claro que aquela noite não seria menos do que incrível!
‘The Trooper’ fez o local tremer. Um ponto especial é a sonoridade do novo kit de bateria de Nicko que se não for identificado como violento no som produzido, e lindo na estética, não tenho palavra melhor pra definir. A batalha entre Eddie, o mascote da banda e Bruce Dickinson tem diversos momentos e piadas… digamos… adultas hahaha. E então vejo as primeiras crianças nos ombros de seus pais, muitas, muitas mesmos. Algumas cantando, outras boquiabertas, mas ali embaixo, segurando-as estavam pais e mamães felizes demais contemplando seus filhos vivendo aquilo.
‘The Clansman’ trouxe o grito de liberdade para Porto Alegre. ‘Revelations’ e sua mudança de palco rompeu o senso comum dos fãs que ali estavam vendo este show pela primeira vez, mesma sensação que tive no Rio de Janeiro. O palco é magnifico e reforço de que dificilmente a banda criará algo tão bonito futuramente. Espero estar errado. Na música, eu atestei um fato: o revezamento entre Adrian e Janick nos solos é ordeiro e padrão. Ótimo pois quem ganham são os fãs com visões e estilos diferentes a cada show.
E quanto a interação com o público, pois bem, lembram da historia da conta a ser paga correta? Vou deixar abaixo as palavras de um risonho, energético e incrédulo Bruce Dickinson:
— “Fizemos três shows no Brasil. Um no Rio foi ok. O de São Paulo foi bom.”
Quando ele cita São Paulo a Arena inicia uma vaia sonora… Então Bruce, cabisbaixo retoma:
— “O de São Paulo foi bom. Aqui em Porto Alegre, acreditávamos que venderíamos uns 20 mil ingressos, mas esgotamos 80 mil (conforme a assessoria do evento, 40 mil pessoas compareceram ao show). Este é o maior público para o qual já tocamos em Porto Alegre.”
E assim Bruce se rende ao publico que já gritava a ponto de não deixar ele completar:
– “O Rio foi ok. São Paulo foi bom. Porto Alegre vai ser incrível pra caralho!” — declarou o cantor, para uma multidão que ali estava atestando tudo aquilo.
E convenhamos, o show de 2008 foi no ginásio do Gigantinho. Comparar aquele show em público com o desta noite me soa como absurdo total. E agora se ponha na pele dos músicos que tinham como lembrança o show no Gigantinho e agora se deparam com 40 mil pessoas ali, passados tantos anos?
Das duas uma: Ou a banda renovou sua geração base de fãs captado mais e mais fãs ou a escolha em 2008 pro Gigantinho foi um tremendo erro.
De toda forma eu escolho a primeira facilmente, e deixo a segundo para vocês de POA discutirem a respeito.
Voltando ao que interessa ‘For The Greater Good Of God’ espalha seus questionamentos, riffs e solos por todo o ambiente e mais uma vez os fãs de Porto Alegre respondem com afinco cantando o refrão.
Em ‘The Wickerman’, a banda chega a uns 70% da dívida paga com a cidade, a explosão que veio com o riff inicia desta musica, tocada por Adrian Smith com toda sua técnica e classe fez com que o guitarrista fizesse não somente o solo normal dela, mas improvisasse outro, ali, na frente de todos os fãs, um momento que para um fã da banda de longa data foi incrível ver Adrian esbanjando seu virtuosismo.
Seguimos com ‘Sign Of The Cross’ que trouxe uma versão sublime, com um som extremamente claro e limpo, pesado e denso.Mais uma aula performática de Bruce e um solo de Dave Murray que me fez cruzar os braços, segurar o queixo e dizer um palavrão memorável.
‘Flight Of Icarus’ tal qual em toda a turnê faz os fãs da velha guarda da banda cantarem a plenos pulmões as promessas do personagem que em nome Deus e pelo seu pai irá voar rumo ao sol. Clássico absoluto, indiscutível e preciso novamente falar do palco. Incrível! E Bruce com seu lança chamas.
Na sequência, e sem dar muito tempo de recomposição dos fãs que ainda estavam batendo palmas, temos aquela musica que até hoje faz com que até pessoa menos fã associar mesmo que de leve com a banda: ‘Fear of The Dark’ assola com energia, gritos e a letra cantada do inicio ao fim. Bruce no palco, fantasiado com uma mascara de “Doutor Praga”, memorando aos médicos que cuidavam dos enfermos durante a peste negra que dizimou a Europa e com a banda em um ritmo cavalar (poucas vezes vi uma versão da musica sendo executada tão fortemente).
‘The Number Of The Beast’ trouxe o fogo e a profecia que se cumpria naquela noite. A banda já estava com a plateia na mão. Tão na mão que se metade do estádio cantava outra metade batia cabeça sem a menor cerimônia.
Entrando em seguida, ‘Iron Maiden’, clássico da banda, música esta que até hoje marca a mente dos fãs na velha piada de que “seja onde for o Iron Maiden vai te pegar!” E pegou, pegou e os fãs sequer tentaram reagir ao ver o imenso Eddie Legacy surgindo por trás da bateria de Nicko, fotos, vídeos, palmas, gritos, a festa se encaminhava ao seu fim.
Aqui abro parênteses rápido para a pseudo despedida da banda no palco. Apesar de sabermos que a banda voltaria para mais três musicas ou três pregos no caixão, alguns fãs, pasmem, começaram a se deslocar para a saída do estádio. Eu fiquei sem entender, mas outros fãs os barravam, gentilmente e explicavam que ainda existiam mais musicas a serem tocadas, todos foram convencidos a ficar surpresos com a notícia. Ali eu pude ter certeza que a banda havia alcançado um público novo. O que é ótimo. Somente o novo tem o poder de renovar e manter um legado e presenciar aquilo, naquele show foi incrível.
A trinca ‘The Evil That Men Do’, ‘Hallowed Be Thy Name’ e ‘Run To The Hills’ fechou a divida que a banda possuía com Porto Alegre, com seus fãs e com todos que se esforçaram de uma maneira ou de outra pra lá estarem.
Aqui também chega ao fim minha saga acompanhando a banda em 2019, e como sempre digo, um show deles pra mim é meu réveillon pessoal. O inicio de um novo ciclo. Algo muito importante não só pra mim, como pra muitos que lá estavam naquela noite que me arrancou lágrimas de alegria em alguns momentos.
Que venha um futuro álbum de inéditas, que venha mais um show em Porto Alegre, que venha mais Iron Maiden. E que possamos um dia morrer não com sonhos mas com memórias.
A banda segue para apresentações na Argentina e Chile ainda este mês.