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Maria Bethânia é campeã na Mangueira e no coração de todos os brasileiros


Chegou tímida, no turbilhão do Rio de Janeiro, e subiu ao palco em 1965. Substituía Nara Leão no show Opinião e, ao lado de Zé Keti e João do Vale, trouxe o samba do morro para o centro da capital carioca. Ao cantar “Carcará”, pegá-lo, matá-lo e comê-lo, inicia uma das mais vitoriosas carreiras da música popular brasileira. Foi uma das primeiras a vender 1 milhão de cópias por aqui e colecionou clássicos como “Explode coração” e “Álibi”.

Ao lado do irmão, Caetano, Gil e Gal, marca época excursionando com os Doces Bárbaros e se consolida de vez não somente por conta da forte voz, mas também pela interpretação. Passa a alternar poemas entre as canções, abarca o teatro nos espetáculos e se torna um dos mais reverenciados nomes de nossa cultura.

De Almir Sater a Roberto Carlos, do folclore popular a canções ribeirinhas, Bethânia cantou o país. E o faz até hoje, após cinco décadas de jornada ininterrupta. Sem jamais esbarrar com o ostracismo, ensinou tantas gerações sobre gestão de carreira, sobre poesia e, acima de tudo, sobre música. Não faz tanto tempo, em qualquer rádio deste país, escutávamos Bethânia. Hoje, a cadência é outra, mas ela não deixa de reverberar. A Estação Primeira de Mangueira que o diga.

Adriana Calcanhotto, Ana Carolina, Vanessa da Mata, Ivete Sangalo, Preta Gil… Todas discípulas de nossa Abelha-Rainha. E são elas que o dizem. Eu só repliquei o mel.

O dia em que esbarrei com Maria Bethânia…

Diego e Bethania - Midiorama
Diego reverencia Maria Bethânia

A primeira vez que a vi, ao vivo, foi em“Maricotinha”. Eu ainda era adolescente, mas já conhecia aquela voz grave que ecoava pela minha casa desde sempre. Fã de Maria Bethânia, meu pai me contava sobre as apresentações que viu na juventude, sobre o show Opinião, sobre a força daquela baiana no palco. E passei a adorá-la. Pelas canções, pelos poemas, pela interpretação, pela personalidade. Nem precisei rondar a cidade para encontrá-la. Estava ali, pelos vinis de casa.

“Maricotinha” foi um marco. Mais de 3 mil pessoas lotando a principal sala de espetáculos de Brasília, no Teatro Nacional. Eu, na última fileira, tentava compreender aquela voz que me arrebatava a cada música. Bethânia se tornou, então, minha principal referência no cancioneiro da música brasileira, ao lado de Elza Soares.

Mais de uma década depois, pude cumprimentá-la. Tamanha correria e assédio em torno da cantora, após o show, que imaginei conseguir um aperto de mão. Um abraço, quem sabe. Acompanhado de minha esposa, segui para o camarim. Abaixo do espelho, sobre uma prateleira, a imagem de Mãe Menininha de Gantois. E foi logo o que comentei quando Bethânia se aproximou. Pedi licença e a coloquei para escutar um áudio, no qual minha filha Mel, de dois anos, exclama o nome de Mãe Menininha. Bethânia vibrou.

Conversamos sobre a Bahia, sobre o fechamento do Teatro Nacional, sobre o ofício do palco. Com os olhos marejados, mencionei o amor de meu pai por ela. Por um instante, o camarim perdeu o caráter artístico e ganhou ares de uma sala qualquer, com todos descalços e uma vitrola ao fundo. Ao final, revelamos a futura chegada de um novo filho, Dom. Com as mãos sobre o ventre de minha esposa, casulo e colmeia de Dom, Bethânia foi a primeira a abençoá-lo.

Antes que fôssemos embora, ela ainda me perguntou: “Qual o nome de seu pai?”. “José Eduardo”, respondi. Com um guardanapo na mão, ela agarrou uma caneta e escreveu: “José Eduardo, um beijo. Lindo filho. Maria Bethânia”. E o coração explodiu.

Minha filha Mel já reconhece a voz de Bethânia e ri quando digo que ela é também filha de nossa Abelha-Rainha. Não à toa, a intérprete foi o enredo vencedor da Mangueira em 2016. Ao escutar o samba-enredo, voltei a me emocionar. Em certo trecho, a letra diz: “Leva meu dom ao Teatro Opinião”. Como se eu pedisse a ela, cantora maior, que carregasse Dom, meu filho, aonde tudo começou. De uma forma ou de outra, Bethânia nos levou todos àquele teatro. E de lá, nunca mais saímos.

Por Diego Ponce de Leon
Diego é jornalista cultural, colunista e crítico de teatro de Brasília – DF.


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