O ano eu não lembro bem, mas foi em uma daquelas ótimas festas depois do VMB, a hoje extinta premiação da MTV Brasil, que eu vi e ouvi o J.Quest pela primeira vez. Vinte anos se passaram e eu os assisti animando milhares de “Brazilians” no BR Day, em plena Sexta Avenida, em Nova York. O amor, a saudade e o espírito de união de quem estava lá era palpável. O Jota estava vivendo seu grande momento e eu ali escutando aquelas canções cheias de esperança e boas vibrações, e me toquei que os mineiros eram verdadeiros mensageiros da felicidade.
Esse ano começou com um novo encontro: Rogério e seu irmão Sideral, juntos, para cantar Cazuza e reverter grana para sociedade Viva Cazuza. Trocamos uma ideia sobre o valor da vida, sobre esse mundo complexo que vivemos. Passou um tempinho e recebi dele o clipe de “Daqui Só Se Leva o Amor”, fui flechado! Chorei e quis saber mais sobre como bate o sentimento no coração do pai da canção e também que cabe perfeitamente no peito de muita gente que, como ele, acredita que é fácil, extremamente fácil, para você e todo mundo amar junto. ‘Bora amar!
Vamos lá, perguntas para o coração responder:
Como nasceu essa canção? Qual sua lembrança e sentimento do momento de criação?
“Comecei a compor esta canção em 2013, quando o Chorão morreu. Fiquei muito abalado e muito triste com tudo aquilo. Na mesma semana perderia também o meu sogro, numa partida extrema, muito semelhante às do Chorão e do Champignon. Fiquei meio pirado e muito assustado e resolvi então tentar escrever algo que fosse para eles e, ao mesmo tempo, para mim mesmo. Algo que pudesse ser um conforto para a alma que, no meu entender, segue seu caminho de luz quando já não há mais vida por aqui. E ainda, um conforto para quem fica, quando alguém se vai sem deixar muita explicação”.
Vocês já cantam o amor, mas essa canção passa uma mensagem direta e necessária para o momento do mundo que vivemos. Você acredita que as pessoas estão preparadas para aceitar que o amor é o que se leva?
“Seria muito legal que estivéssemos todos preparados sim. Infelizmente, o que temos assistido de ruim, mundo a fora e no Brasil, é o resultado de nossa própria desumanidade. Mas, basta que estejamos de fato na linha de tiro, seja por uma doença na família, do corpo ou da alma, ou por estar no epicentro de uma guerra estúpida, religiosa ou por pontos de tráfico, para começarmos a nos apoiar no que todos temos de mais forte e valioso, indistintamente de credo, cor ou conta bancária, que são as relações de amor. Chegaremos a um ponto tão sufocante de nossa existência que o amor será a única saída”.
Estamos em um mundo que vive uma sensação de ódio latente, chega a ser palpável. Quando o desamor parece ser a doença da humanidade, você acha que há luz no fim do túnel?
“Eu prefiro sempre acreditar que sim, pois acreditar que não seria o fim chegando cedo. O amor é essa luz, sem a qual nossa existência seria um eterno “viver pra que?”. Nascer, respirar, enxergar, caminhar, aprender, compor, cantar, criar um filho, amar. A vida é para ser vivida, e não sofrida. Sei que isso é algo que a gente precisa exercitar, cada dia um pouco mais, mas levo fé que exista algo além dessa maldade toda”.
Fazer sem esperar nada em troca, querer o sucesso do outro, dar a outra face, parecem coisas impossíveis neste mundo competitivo, quando a humanidade consegue aceitar dor e violência muito mais do que realiza o que é o verdadeiro amor. Seria utopia acreditar que podemos mudar o mundo a partir desse sentimento?
“O que é utopia para uns pode ser apenas a vida real pra outros. Quem tem um plano de conduta para a vida, vai encontrando as brechas para deixar suas pétalas pelo caminho. E não é pouca gente que é assim. Acredito muito na força do sentimento coletivo. Na verdade, acho que a maioria das pessoas é ainda muito otimista em relação à máxima de que “o bem vence o mal”. Então, vamos pra cima!”.
Vamos voltar a sua infância, quando você lembra ter experimentado uma sensação que você identificou o amor?
“Eu fui uma criança que recebeu muito amor. De meus pais, avós, tios, tias e amigos da família. Tenho plena consciência de que isso fez muita diferença na formação de minha personalidade e caráter. Seguramente eu os amei muito também, ainda criança. Desde que me tornei pai, a vida tem me proporcionado perceber claramente o quanto uma criança pode amar a quem as ama, e isso é um maravilhoso ciclo virtuoso. Como diz Drummond, “amar se aprende amando”.
E amor dos fãs, você consegue expressar em palavras?
“Ah, esse amor é bem louco. Obviamente eu também tenho meus grandes ídolos. Então tento sempre me colocar na posição de fã pra poder cuidar desse amor da melhor maneira. Mas isso acaba às vezes sendo difícil de equilibrar, pois a vida acabou me proporcionando conhecer um pouco do lado de cá. É muito bacana ser “amado” pelo trabalho que se realiza, por uma canção, por uma energia que se emana. Eu costumo brincar que não existe sensação melhor que a de se estar no show da sua banda preferida, cantando todas! Meu amor pela música, pelo rock-brasil, pela poesia, mudou a minha vida para muito melhor! Há que se dar muito valor a esse tal ‘amor de fã’ “.
Este clipe foi gravado no Brazilian Day, com uma galera de todas as partes do Brasil e dos EUA. Como você definiria aquele momento na sua vida e na do Jota Quest?
“Esse encontro anual com a comunidade brasileira em Nova York, em plena 6ª avenida, é uma viagem total!! Essa foi nossa segunda vez no Brazilian Day, a primeira foi em 2007. Eu sonhava em poder participar novamente, pois achava que não havia aproveitado a primeira oportunidade completamente. Queria fazer melhor, com mais entrega e sentimento”.
“Da outra vez, há dez anos, éramos ainda um pouco imaturos em relação às dimensões sociais e emocionais deste evento. Quando recebemos o convite para repetir a dose, foi como ganhar um super presente de 20 anos de banda. Não foi a toa que chegamos uns dias antes. A ideia era mesmo respirar cidade e o clima do evento. Passeamos bastante, filmamos em vários lugares, meio sem saber exatamente o que iríamos fazer com as imagens”.
“Os preparativos incluíram um ensaio mágico com o Nile Rodgers, que é de NY, e que participou pela primeira vez de um show nosso. E ainda uma incrível jam session com uma turma de alunos brasileiros da Berklee Univerty of Music, no lendário Avatar Studios, onde acabamos filmando o take principal do clipe, no terraço, que descobrimos por lá, também por acaso. Preparamos então um repertório com as canções mais animadas e tocantes que temos e partimos “pro” abraço, literalmente. Foi tudo muito emocionante, tanto para a gente, quanto para todo mundo que esteve por lá. Ser brasileiro é algo muito especial, talvez, exatamente por não ser lá assim tão fácil de sê-lo. Esta festa representa uma espécie de “resistência”. É muito bom poder fazer parte disso”.
Do fundo do coração me diz, o que é o amor?
“O amor é a paz.”
Por Horácio Brandão